sábado, 30 de outubro de 2010

Eu não tenho uma história. É incrivelmente perturbadora a forma como desvio de um assunto para trilhar em um mar de minúsculos detalhes. Os detalhes sempre me impressionaram. Eu os escolheria. O exato segundo em que um ataque cardíaco faz um coração parar de trabalhar, para mim, é mais assustador do que a própria morte. Eu não saberia descrever bem essa minha ladainha de disfarces. Mas sei que não disfarço bem. Eu estou equivocada com meus próprios detalhes. Eles me dispersam do que é de real importância. Eles me fazem pensar como seria se fosse do jeito que se fizeram ou não, imaginar um trilhão de possibilidades - e estas, por sua vez, me fazem esquecer de tudo. Eu preferia não prestar tanta atenção. Eu preferia ter um senso comum. Eu preferia não ter que dar explicações à tudo. Tornar sentimentos em coisas científicas fazem com que eles percam totalmente o sentido. Todas as pessoas deveriam saber que o amor é uma coisa que pode ser explicada cientificamente para que ninguém mais dissesse que não há cura para o mesmo.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

As minhas palavras parecem deixar vazar coisas entre seus espaços. Parecem transbordar por detrás delas mesmas. Eu sou uma retórica para mim. Eu vivo constantemente lutando para me convencer de que sou eu.
Eu estive tentando me submeter a alguma coisa. Talvez isso me livrasse da vazão de ser. Aquela empolgação momentânea que as pessoas sentem por coisas que elas mesmas sabem que, futuramente, lhes causará vergonha. Mas esse instante recompensa a segunda ocasião. Me parece formidável saber o que é ser feliz nem que seja apenas por um minuto. No entanto, descobrir a felicidade também me causa medo. Um minuto da tal consegue amargurar cinquenta anos vividos em profunda angústia. Eu não sei bem se seria melhor viver uma vida inteira sem tirar-lhe uma lasca ou viver infeliz por ter sentido seu sabor ofegante. Mas nesse momento estou, impreterivelmente, disposta a senti-la por esse tempo delimitado. Eu preciso provar de tudo antes que o tempo passe e as coisas pareçam perder o sentido.
Eu odeio necessitar que estejam dispostos a me ouvir pacientemente sem que queiram me esmurrar. Seria menos doloroso que essa ânsia se expressasse visivelmente a mim do que se a mesma fosse disfarçada com palavras que foram ditas por um impulso de cordialidade. Entre todas as coisas no mundo que eu sempre odiei - as muitas - o fato de as pessoas sentirem satisfação em tornarem-se inconvenientes sempre me causou profunda repugnância. Eu gostaria de saber o que as agrega de tão bom para agirem de tal forma. Por não saber, não me resta nada a não ser me perguntar todos os dias se estou causando algum mal fazendo transbordar as minhas convicções. Não sei se poderiam ser atribuídas à minha vontade de mudar o que está errado. Mas... Errado comparado a quê? Eu não vejo escolha. Eu não vejo escolha a não ser olhar no espelho e me convencer de que este mundo não é para mim. Eu também não sou para ele. E nós estaremos em relativa paz enquanto eu procurar me conformar. Eu preciso me submeter a uma só verdade: a que não existe. Por este simples fato, tudo poderia parecer vago. Mas essa sensação de que nada existe me parece mais complexa do que uma aglomeração de verdades confusas.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Eu não quero mais derramar nada - nem as minhas lágrimas nem as minhas forças. Eu não quero mais fazer força para nada. Eu não quero mais sentir. Vai começar tudo de novo. Não posso deixar... Eu vou me dedicar ao vazio. Eu vou me dedicar ao que não existe. Seria mais formidável atunar o que há em mim e escancarar para compreenderem que isso não me atinge. Seria mais conveniente ser formidável e não ser nada. Seria formidável não ser. Eu prefiro a minha tese que custei a sustentar. Eu prefiro ser essa multidão de coisas - mas elas sempre se resumem a nada. Insistem em se resumir ao vazio que eu sempre temi. Tudo, menos o vazio. Ele não faz bem a ninguém. Ninguém pode ser tão vazio assim quanto imagino. Ninguém pode ser tão desgastante quanto a dor que você traz a si mesmo. A dor é alguém. Ela não é sentimento: ela corrói fisicamente.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Como o que reluz... Você vê o brilho, vê a luz. Mas, repare: nunca se vê o que há verdadeiramente. Você sabe que precisa disso. Você tem consciência de que é a luz que, por vezes, te fez olhar atentamente com os olhos quase que fechados para que, incessantemente, tente enxergar o que há de tão extraordinário. Você faz muita força para compreendê-la. Mas saiba: nem sempre é o final do túnel. Você sabe que pode acabar com a sua vida em uma fração de segundos. Mas sabe que precisa continuar olhando para aquela luz. Sabe que precisa desvendá-la. Não é você quem pede - tampouco seu coração. O que te induz a essa busca é outro mistério ao qual você não se importa em desvendar - pelomenos agora. Contanto que veja a luz. Ela é a sua grande ocupação deste momento: você não pode parar de olhá-la. Não consegue. Qualquer esforço será inútil. É completamente distinto da curiosidade - é necessidade. Você precisa da luz e, agora, nada será bom o suficiente para desviar sua atenção - até que ela se apague como a noite após o dia e você a encare como o primeiro passo ao se levantar. Aí a escolha será sua. Estará em suas mãos encará-la: agradecendo por mais um amanhecer ou lamentando-se com o desejo de jamais ter acordado.